Bolsonaro é alvo do 75º pedido de impeachment, agora por tentativa de apropriação das Forças Armadas

A Câmara dos Deputados recebeu, nesta quarta-feira (31/03), o 75º pedido de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). O documento foi apresentado pelos parlamentares líderes da Oposição e da Minoria no Senado e na Câmara, senador Randolfe Rodrigues (REDE/AP), senador Jean Paul Prates (PT/RN), deputado Alessandro Molon (PSB/RJ) e deputado Marcelo Freixo (PSol/RJ), além do líder da minoria no Congresso, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).

A petição diz que o presidente da república está tentando, de forma autoritária, se apropriar indevidamente e para interesses pessoais das Forças Armadas, com “ameaça evidente à democracia”. Os parlamentares citam o Artigo 7º da Lei do Impeachment, que estabelece crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais, como “servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua” e “incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina”.

No total, os parlamentares enumeram sete infrações que justificam o pedido de afastamento do presidente da república, como explica o senador Jean Paul Prates:

1 –  (art. 7º, item 5) Ao promover a troca no comando do Ministério da Defesa e de todas as Forças Armadas, o Presidente da República parece pretender se utilizar das autoridades sob sua supervisão imediata (à luz do trecho “autoridade suprema do Presidente da República”, conforme o art. 142 da Constituição, e da hierarquia direta da relação de fidúcia existente entre Presidente e Ministros de Estado) para, literalmente, praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua;

2 – (art. 7º, item 6) Qualquer nefasta pretensão de subverter a ordem política e social perpassaria, com a utilização das Forças Armadas, por meios violentos ou baseados em graves ameaças institucionais. Justamente por ser conduta absolutamente grave, e dado o passado sombrio vivido pelas instituições democráticas brasileiras, tal conduta foi elevada ao patamar de crime de responsabilidade;

3 – (art. 7º, item 7) A troca do comando do Ministério da Defesa, anteriormente ocupado por cidadão que gozava de integridade e de respeitabilidade por todos os Poderes constituídos, bem como a consequente troca em todos os comandos das Forças Armadas não pode se prestar a nada senão à mera e vazia incitação dos militares à desobediência à lei ou infração à disciplina. Trata-se do fenômeno de tentativa de cooptação dos quartéis, incitando uma espécie de revolta natural de militares com o status quo, para que almejem à mudança e à ruptura da condução dos rumos da história;

4 – (art. 7º, item 8) Com a provocação da animosidade entre as classes armadas contra as instituições civis. É o que se viu na manifestação da própria Deputada Federal Bia Kicis, por exemplo, que é nitidamente uma das apoiadoras mais ferrenhas do Presidente da República, quando se manifestou em tom aparentemente golpista e subversivo no tocante ao episódio do policial morto por outros policiais em Salvador. A manifestação da Deputada, que foi acompanhada por familiares do Presidente, dá o tom de como vem sendo conduzida a tentativa de instalação do projeto de quebra da ordem democrática arquitetada pelo Presidente, sempre tendo por base a tentativa de ganhar apoio nos quartéis;

5 – (art. 6º, item 5) É de se dizer que tais pretensões que demonstram os arroubos autoritários do principal mandatário da República têm como pano de fundo, entre outros motivos, sua pública e manifesta insatisfação com o Poder Judiciário, notadamente o Supremo Tribunal Federal. Foram inúmeras insinuações, em seus 2 anos de mandato, no sentido de fechar o Tribunal ou de tecer críticas infundadas a suas decisões e de distorcer a mens dos julgados;

6 – (art. 8º, item 3) O Presidente da República já deu diversas declarações públicas no sentido de que pretendia decretar – de ofício e individualmente – estado de sítio no Brasil, sob o argumento de enfrentar a pandemia do coronavírus. A relação entre a gravíssima crise sanitária e socioeconômica vivida pelo Brasil – infelizmente, potencializada pelo patente fracasso do Presidente como gestor do país, eminentemente por sua postura negacionista – e a decretação de medidas extremas e supressoras de direitos fundamentais realmente escapa a esses requerentes, mesmo num esforço imaginário hercúleo;

7 – (art. 8º, item 7) A Lei nº 13.979, de 2020, que “dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”, permite aos governadores e prefeitos a adoção de diversas ações para enfrentar a covid-19, incluindo, por exemplo, isolamento, quarentena e uso de máscaras, o que já foi confirmado pelo STF nas ADIs 6341, 6343 e 6625. Como bem decidiu a Corte, trata-se da competência comum e concorrente para administrar e legislar sobre os serviços de saúde, especialmente importante durante o caos sanitário que a pandemia nos impôs;

 

Em menos de dois anos e meio no cargo, Bolsonaro já é o presidente recordista em pedidos de impeachment. A Agência Pública de Jornalismo Investigativo aponta que, ao todo, 1.434 pessoas e mais de 476 organizações já assinaram pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro.

E com o desta quarta-feira, já foram enviados 75 documentos ao presidente da Câmara dos Deputados, sendo 58 pedidos originais, 7 aditamentos e 9 pedidos duplicados. Até agora, apenas 5 pedidos foram arquivados ou desconsiderados. Os outros 70 aguardam análise.

 

No final do documento protocolado nesta quarta-feira, os líderes apresentaram como testemunhas:

– General Fernando Azevedo – ex-Ministro da Defesa;

– Edson Leal Pujol – ex-Comandante do Exército;

– Ilques Barbosa – ex-Comandante da Marinha;

– Antônio Carlos Bermudez – ex-Comandante da Aeronáutica;

– José Viegas Filho, Ministro da Defesa entre 1º de janeiro de 2003 e 8 de

novembro de 2004;

– Nelson Jobim, Ministro da Defesa entre 25 de junho de 2007 e 4 de agosto de

2011;

– Celso Amorim, Ministro da Defesa entre 4 de agosto de 2011 e 1º de janeiro de

2015;

– Jaques Wagner, Ministro da Defesa entre 1º de janeiro de 2015 e 8 de outubro

de 2015;

– Aldo Rebelo, Ministro da Defesa entre 8 de outubro de 2015 e 12 de maio de

2016; e

– Raul Jungmann, Ministro da Defesa entre 12 de maio de 2016 e 27 de

fevereiro de 2018.

Bruno Elander – Rádio Rio Mar

Foto: Marcos Corrêa/Divulgação Governo Federal