Editorial: Caminhar juntos, uma urgência inadiável

Editorial Por Luis Miguel Modino*

Caminhar juntos sempre foi um desafio, que hoje se tornou necessidade numa sociedade dividida, onde o confronto tem sido assumido como atitude pessoal e política. Na sua última encíclica, o Papa Francisco nos diz que “uma tragédia global como a pandemia do Covid-19 despertou, por algum tempo, a consciência de sermos uma comunidade mundial que viaja no mesmo barco, onde o mal de um prejudica a todos”, recolhendo uma ideia que ele mesmo partilhava na oração que aconteceu na Praza de São Pedro vazia, no dia 27 de março de 2020.

A pandemia tem nos mostrado a necessidade de cuidar uns dos outros como algo que faz possível a vida em plenitude. Nossa falta de cuidado com nós mesmos, provoca o sofrimento dos outros, do mesmo modo que os outros, quando não se cuidam, podem fazer com que a gente sofra. As consequências disso tem se tornado evidentes no Brasil, que vive uma situação dantesca, beirando os três mil óbitos por dia, algo que infelizmente, muita gente não tem e não quer ter consciência do que realmente significa.

A sociedade brasileira é desafiada cada vez mais a refletir sobre essa situação, a se questionar sobre as atitudes e responsabilidades que devem ser assumidas por todos e cada um, cada uma, de nós. Fazer de conta que o que está acontecendo é normal, que é o jeito, uma atitude que parece estar presente em muitos brasileiros e brasileiras, também naquele a quem foi confiado conduzir politicamente o país, só piora uma situação a cada dia mais caótica.

O diálogo deve ser assumido como caminho a seguir, em vista de um discernimento que possa ajudar a superar as gravíssimas consequências da pandemia. Mas para isso somos desafiados a escutar, a partilhar pensamentos e sentimentos que ajudem a fazer realidade um sentimento comum de fraternidade e empatia pelo sofrimento do próximo.

A Igreja católica tem feito insistentes chamados nesse sentido nos últimos meses. Por isso, gostaria de destacar hoje a importância da convocatória que a Arquidiocese de Manaus, através do seu arcebispo, Dom Leonardo Steiner, fazia na semana passada, ao convocar uma Assembleia Sinodal Arquidiocesana, onde será refletida a vida da Igreja de Manaus, mas também, e sobretudo, a vida do povo, especialmente daqueles que mais sofrem, tentando assim fazer vida as palavras do Papa Francisco na Querida Amazônia, onde sonha “com comunidades cristãs capazes de se devotar e de se encarnar na Amazônia”.

A pandemia da Covid-19 tem mudado a vida cotidiana da gente, também na vivência da fé. Por isso é importante tomarmos consciência da atual situação que a gente vive e das circunstâncias que determinam hoje nossa realidade social. As exigências e apelos que hoje devem ser enfrentados em consequência da nova realidade que o mundo vive devem nos levar a uma reflexão comum, algo que Dom Leonardo expressa na convocatória da Assembleia Sinodal da Arquidiocese de Manaus, que deve ser um instrumento que ajude a responder aos novos desafios, nascidos de uma realidade a cada dia mais complexa e desafiadora.

É tempo de caminhar juntos, de enxergar o outro desde uma atitude de fraternidade, de poder mostrar que o sofrimento do outro também nos atinge. Assumir o cuidado da gente e dos outros se tornou uma urgência inadiável, algo a ser feito já.

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*Missionário espanhol e Assessor de Comunicação do Regional Norte 1 da CNBB