Editorial: União e sacrifício, duas armas imprescindíveis para vencer o COVID-19

União não pode ser equiparada ou confundida com submissão às diretrizes, as vezes os caprichos infantis, de quem manda. Qualquer desavença é motivo para expulsar alguém do jogo, igual criança mimada que se sente dono da bola e não se conforma se ele não é a única estrela do time. Muitos não tem problema em afirmar que sacrificar vidas humanas se torna algo normal. Quando o sacrifício é de todos, o aperto se supera mais facilmente, mas quando só atinge um grupo, aí a paulada doe demais.

Editorial por Luis Miguel Modino*

A gente passa por uma situação que tem mudado a vida da humanidade, ainda não sabemos por quanto tempo, determinando um jeito novo de enfrentar o dia a dia. O desejo de superar este momento está presente em bilhões de pessoas que esperam com um sentimento de incerteza uma luz que possa ajudar a descobrir por onde continuar avançando.

Uma atitude fundamental é a união, que deve estar presentes nos diferentes âmbitos que fazem parte da vida do ser humano. Ontem, o mundo se unia numa jornada de oração, jejum e penitência, onde a humanidade, irmãos e irmãs de todas as tradições religiosas, eramos convocados pelo Alto Comitê para a Fraternidade Humana. Foi um momento em que cada um foi chamado a rezar, como comunidade humana, superando divisões que sempre fizeram parte e provocaram lutas, inclusive com derramamento de sangue, entre diferentes confissões religiosas.

Uma oração em comum, motivada pela necessária fraternidade que deve estar presente neste momento de dor e de tragédia que estamos vivendo.Uma união que tem que nos levar a superar aquela ideia surgida no Concilio de Trento, quase quinhentos anos atrás, que dizia que fora da Igreja não existe salvação. Uma atitude cada vez mais presente nos dias atuais, nem só no plano religioso, que leva muitos a dizer que a única coisa que presta é aquilo que ele defende, aquilo do qual ele faz parte.

União não pode ser equiparada ou confundida com submissão às diretrizes, as vezes os caprichos infantis, de quem manda, sobretudo quando estamos diante de alguém que quer conduzir a realidade promovendo um constante clima de guerra, que vê quem discorda dele como alguém contra quem temos que jogar pesado. Qualquer desavença é motivo para expulsar alguém do jogo, igual criança mimada que se sente dono da bola e não se conforma se ele não é a única estrela do time. Alguém que não quer ganhar o jogo, e sim ele poder fazer um gol, mesmo que isso signifique perder de goleada. O famoso 7 a 1 está voltando de novo, mas o dono da bola está feliz porque ele marcou um gol.

A gente deve ser consciente, desde um sadio exercicio de união que estamos diante de uma pandemia que nós não esperávamos, mas agora está aí. São muitas as pessoas que estão morrendo, os últimos dados falam de quase 14 mil mortos e mais de 200 mil contagiados no Brasil, números subnotificados, segundo diferentes opiniões. Esta é uma doença que assola, como a gente vê diante de tantas pessoas que morrem sozinhas e muita gente morre sem poder fazer nada. Não adianta dizer o que eu posso fazer, o decisivo é querer se unir aos outros para vencer a batalha.

Outra atitude que não pode faltar é o sacrifício, mas aí a gente tem que se perguntar o que estamos dispostos a sacrificar. Muitos não tem problema em afirmar que sacrificar vidas humanas se torna algo normal, mas isso tem que levar a questionar a essas pessoas sobre qual seria sua resposta se um dos sacrificados fosse ele mesmo, inclusive alguém que ele gosta. Quando o sacrifício é de todos, o aperto se supera mais facilmente, mas quando só atinge um grupo, aí a paulada doe demais.

Sempre é melhor todos jejuar um dia do que um pequeno grupo se ver obrigado a se privar eternamente daquilo que deveria ser comum. Um sentimento fundamental na vida do cristão é a partilha, dividir aquilo que a gente tem. As vezes isso pode ser visto como um sacrifício, mas em outros momentos é uma graça, saber que alguém se sacrificou para eu conseguir superar esse momento de dificuldade.

Não estamos em tempo de promover guerra, nunca vamos superar o grave momento atual com divisão, com atitudes egoístas, que evitem qualquer tipo de sacrifício da parte da gente. Ou a gente se une como humanidade, para rezar, mas também para lutar, ou o fim está cada vez mais próximo.

Ouça: 

*Missionário espanhol e membro da equipe de comunicação da REPAM – Rede eclesial Pan Amazônica.