A Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) negou, por unanimidade, pedido da Câmara Municipal de Manaus (CMM) para derrubar decisão liminar que impede realização de quaisquer atos preparatórios voltados à deflagração de um novo concurso público, até o julgamento definitivo da anulação do anterior.
A decisão foi proferida no âmbito do Agravo de Instrumento nº 0013129-76.2025.8.04.9001, no qual o colegiado acompanhou o voto do relator, desembargador Abraham Peixoto Campos Filho, que já havia deferido parcialmente o efeito ativo do recurso, ao reconhecer a presença de vícios relevantes no ato administrativo que anulou o concurso de 2024.
Na decisão, o relator afirma que o poder de autotutela da administração pública não é absoluto, pois encontra limites intransponíveis no Estado Democrático de Direito. Segundo o magistrado, a anulação integral de um concurso público somente se justifica por comprovação de vícios concretos, graves e insanáveis, capazes de comprometer a totalidade do certame, o que não se comprova no caso do concurso de 2024.
De acordo com o voto, a anulação total do concurso afronta o princípio da proporcionalidade, especialmente nos subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. O relator destacou que as inconsistências apontadas — como erro de gabarito, arredondamento de notas e ausência de cotas raciais — possuem caráter pontual e sanável, passíveis de correção individualizada ou, quando muito, de anulação parcial, sem comprometer a lisura global do certame.
Falta de motivação própria
A decisão também ressaltou que o ato administrativo de anulação nº 040/2025, da CMM, fundamentou-se apenas na Recomendação nº 003/2025 do Ministério Público do Estado (MPAM), sem motivação própria suficiente por parte da administração pública. Para o TJAM, tal circunstância caracteriza possível vício de motivação, especialmente porque a presidência da Câmara não aguardou a conclusão da sindicância interna, que posteriormente afastou a existência de irregularidades graves.
Falhas sanáveis
Outra alegação da CMM não reconhecida pelo TJAM foi a de que a ausência de publicação do contrato com a banca organizadora no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) justificaria a anulação do certame. Segundo o desembargador Abraham Peixoto, esse “é um vício formal e sanável, não sendo razoável nem proporcional anular um concurso com expressivo número de candidatos e custos elevados já despendidos por falha passível de regularização posterior.
“Nesse prumo, a jurisprudência pátria, em matéria de atos administrativos, orienta no sentido da preservação do ato e da convalidação sempre que possível, por ser esta a medida mais condizente com o interesse público primário”, afirma o desembargador Abraham Peixoto, na decisão.
O magistrado também reafirmou entendimento consolidado dos tribunais superiores no sentido de que candidatos aprovados dentro do número de vagas possuem direito subjetivo à nomeação. E mesmo aqueles classificados fora das vagas imediatas, com mera expectativa de direito, são protegidos pelo princípio da segurança jurídica, previsto no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal.
Por fim, o TJAM concluiu que, sendo o ato anulatório possivelmente ilegal por vício de motivação, a Administração não pode se valer dele para justificar a realização de um novo concurso, sob pena de violação à estabilidade das relações jurídicas e ao controle judicial dos atos administrativos.
A decisão representa mais um capítulo na discussão judicial que envolve o concurso da CMM, realizado em novembro de 2024, e reforça a necessidade de observância rigorosa dos princípios da legalidade, motivação, proporcionalidade e segurança jurídica na administração pública.
Da Redação
Foto: Divulgação
