Cinco anos atrás, o Papa Francisco surpreendia o mundo com a publicação de uma encíclica dirigida à humanidade, onde ele pedia que a gente cuidasse do planeta. A pandemia do Covid-19 nos mostra que muitos dos chamados que aparecem em Laudato Si´ desenhavam realidades já presentes, mesmo ocultas, que agora tem se explicitado mais claramente. Nossa falta de cuidado com a natureza tem consequências, e isso aparece de forma ainda mais explicita na Amazônia. Essa ligação entre tudo e entre todos também deve ser assumida no plano da fé. Se alguém quer ser cristão, deve ter como atitude fundamental o cuidado da casa comum.

Editorial por Luis Miguel Modino*

Cinco anos atrás, o Papa Francisco surpreendia o mundo com a publicação de uma encíclica dirigida à humanidade, onde ele pedia que a gente cuidasse do planeta, que ele definia como nossa casa comum. Nesta semana estamos celebrando 5 anos da Laudato Si´, que como dizia nosso arcebispo, Dom Leonardo Steiner, numa live que aconteceu na quarta-feira, junto com o cientista Carlos Nobre, alguém que tem dedicado 40 anos ao estudo da Amazônia, e Átila Iamarino, biólogo com grande presença no campo da divulgação científica, pois ele tem um canal no YouTube com mais de dois milhões de inscritos, “a Laudato Si´ é um texto que se torna mais importante do que 5 anos atrás”.

A pandemia do Covid-19 nos mostra que muitos dos chamados que aparecem em Laudato Si´ desenhavam realidades já presentes, mesmo ocultas, que agora tem se explicitado mais claramente. Nossa falta de cuidado com a natureza tem consequências, e isso aparece de forma ainda mais explicita na Amazônia. A destruição do bioma amazônico, uma realidade que avança exponencialmente nos últimos meses, também em tempo de quarentena, está se tornando uma grave ameaça, nem só para quem vive na região, mas para o planeta.

Um elemento fundamental, ainda mais diante da pandemia que estamos sofrendo, é descobrir que os recursos naturais não podem ser usados de maneira egoísta, pensando em satisfazer desejos pessoais ou de pequenos grupos de poder. Quem assume a fé cristã como modo de vida, deve entender, seguindo aquilo que aparece no primeiro livro da Bíblia, que Deus nos colocou no mundo, não para dominar e sim para cultivar e cuidar da nossa casa comum. O livro do Gênesis nos faz descobrir que nossa falta de cuidado tem repercussão na vida dos outros, aos poucos vamos degradando a vida, nem só a nossa, mas a vida da humanidade.

Mais uma vez somos chamados a aprender com aqueles que secularmente foram vistos como incivilizados, mas que hoje nos mostram que seu conhecimento e modo de vida deve ser assumido como algo válido para todos. Os povos indígenas, que conseguem entender a vida como um todo e tem a capacidade de enxergar a realidade como fonte de vida, devem ser considerados como uma referência nesse novo modelo social que somos desafiados a instaurar no pôs-coronavírus. Frente àqueles que defendem que temos que civilizar os índios, temos que afirmar que se faz necessário sermos mais indígenas, assumir seu jeito de entender a vida e de se relacionar com o ambiente.

Carlos Nobre, cientista brasileiro reconhecido internacionalmente, inclusive mais do que na sua pátria, afirma que “os indígenas sempre tiveram a proteção da floresta como um valor cultural e um valor espiritual. Essa evolução cultural e espiritual é a sua base ecológica, sempre buscaram manter o equilíbrio”. Isso se contrapõe a um modelo que defende o lucro acima de tudo, inclusive, acima da vida humana,  fomentando um desequilíbrio que está tendo consequências na saúde da humanidade.

A pandemia que a gente está vivendo pode ser o início de uma nova realidade mundial, naquilo que faz referência à saúde pública. Seguindo as palavras de Carlos Nobre, a destruição da Amazônia, a falta de cuidado da nossa casa comum, pode ter como consequência “uma enorme fuga de micro-organismos provocando pandemias surgidas da Amazônia”. Não podemos esquecer que tudo está interligado, que o cuidado promove a vida, enquanto sua ausência tem como consequência a morte, especialmente dos mais pobres, vítimas principais de qualquer crise.

Essa ligação entre tudo e entre todos também deve ser assumida no plano da fé. Se alguém quer ser cristão, deve ter como atitude fundamental o cuidado da casa comum. Sabemos que isso não é fácil, mas devemos nos treinar nessa atitude nascida da Laudato Si´, inspirada no Deus criador, que nos colocou no mundo não como donos e sim como cuidadores daquilo que não é propriedade de ninguém e sim patrimônio comum.

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