O Ministério Público Federal (MPF) obteve uma decisão liminar favorável em defesa dos direitos do povo indígena Kinja, mais conhecidos como Waimiri Atroari: a Justiça decidiu condicionar a continuidade do processo de licenciamento para implantação da linha de transmissão de energia entre Manaus (AM) e Boa Vista (RR) – o Linhão de Tucuruí – ao acolhimento da proposta de compensação oferecida pela Associação do povo Kinja.
Após consulta realizada nos moldes recomendados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), os indígenas decidiram requerer o pagamento de pouco mais de R$ 133 milhões como compensação pelos prejuízos irreversíveis que o empreendimento irá causar a seu território e seus modos de vida e cultura, tendo em vista que o projeto prevê a passagem de 123 quilômetros da linha de transmissão, com instalação de torres, pelo interior da terra indígena Waimiri Atroari, entre o Amazonas e Roraima.
Na decisão, a Justiça considerou que, se em algum momento houve concordância dos indígenas com o empreendimento, está condicionada à aceitação e implementação da proposta de compensação ambiental que vem sendo ignorada pelo Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), pela Fundação Nacional do Índio (Funai), pela Transnorte Energia e pela União. “É claro e inequívoco que o empreendimento já está causando ao povo kinja (Waimiri Atroari) prejuízo patrimonial e restrição de uso de recursos naturais e impactos irreversíveis – como impossibilidade de ritualizar em alguns locais sagrados e destinados a manutenção de cultura e tradição”, diz trecho da decisão.
Sobre o valor requerido pelos kinja como compensação, a Justiça afirmou que chega “a ser insignificante o valor pleiteado diante do lucro que será gerado pela exploração da matriz energética”, citando ainda, a título de exemplo, que o lucro líquido anual de 2020 da empresa Amazonas Energia é superior a R$ 500 milhões, conforme declarado em demonstrativo financeiro tornado público no site da empresa, e que o lucro da empresa Cemig foi de R$ 2,87 bilhões, conforme dados da própria empresa.
“Portanto, empresas de energia elétrica são as detentoras de lucros elevadíssimos no país, não havendo crise para elas, sendo inegável que a crise atinge apenas o consumidor brasileiro. Assim, a recusa no aceite da pequena proposta compensatória oferecida é indevida, injusta desproporcional e sem qualquer plausibilidade”, ressalta trecho da decisão.
Caso o empreendimento insista em seguir com as obras sem o pagamento da compensação, a Justiça afirma na decisão que poderá haver bloqueio de contas de empresas públicas ou privadas beneficiárias com a exploração da matriz energética decorrente do Linhão, em razão dos direitos do povo Kinja. A ação tramita na 1ª Vara Cível da Justiça Federal do Amazonas, sob o número 1030014-50.2021.4.01.320. Cabe recurso da decisão.
Entenda o caso – O linhão de Tucuruí, linha de transmissão de energia que pretende ligar Manaus a Boa Vista por meio do Sistema Interligado Nacional, deve se estender por 721 quilômetros – desses, 123 estão dentro da reserva Waimiri Atroari, localizada entre o Amazonas e Roraima. Como andamento das tratativas para consenso, as lideranças Waimiri Atroari entregaram ao governo federal e ao Empreendedor Transnorte Energia, em agosto de 2021, a proposta daquilo que entendem como o mínimo aceitável para que seja permitida a passagem do linhão de Tucuruí por suas terras.
No documento, estão contidas todas as condições consideradas indispensáveis e indiscutíveis pelo povo indígena para que, se aceitas em sua totalidade e após manifestação de aceitação expressa e formal do governo federal e da Transnorte Energia, fosse possível então dar seguimento às etapas seguintes do empreendimento. As compensações dizem respeito a 37 impactos socioambientais, sendo 27 deles irreversíveis e 10 mitigáveis.
Com informações da assessoria
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