Editorial: A pior friagem é aquela que congela os corações

Editorial Por Luis Miguel Modino*

A friagem no Brasil, inclusive no Norte do país, se tornou notícia nas últimas horas, e isso deve nos levar a nos questionarmos sobre o perigo desse frio tomar conta dos nossos corações e que eles fiquem congelados. Um coração congelado não reage diante das situações, fica impassível, não expressa sentimentos, e acaba morrendo.

Quando o coração da gente esfria, a gente deixa de ser humano. Perder a humanidade, algo cada vez mais presente na sociedade atual, se tornou uma realidade preocupante. A humanidade é a condição que nos leva a nos preocuparmos com o sofrimento dos outros, que nos faz reagir diante das injustiças, que nos leva a lutar por direitos para todos e todas, mas especialmente para os mais fracos, para os pequenos, para aqueles que não contam.

Nesta semana, Dom Joel Portella Amado se perguntava: “Se nós não somos um país que pode confiar sequer na garantia e na proteção dada pela sua lei maior, onde é que nós vamos?” Ele fazia esse questionamento no acampamento da Esplanada dos Ministérios, onde os povos indígenas lutam por defender os direitos garantidos na Constituição Federal, e o primeiro direito é à terra, que para os povos originários é Mãe e não objeto de lucro e exploração desmedida.

Diante de uma luta que se prolonga durante semanas, muitos de nós fazemos de conta que não está acontecendo nada. Inclusive deixamos ser manipulados por meios de comunicação que na tentativa de favorecer interesses políticos e econômicos distorcem informações, colocando as vítimas como culpados.

O que fazer para aquecer os nossos corações? Como mostrar empatia por aqueles que são vítimas de projetos de morte? Qual é o lado que a gente escolhe? Como deixar de estar sempre acima do muro e tomar postura pelas vítimas? Como evitar continuar sendo manipulados por aqueles que estão ao serviço do poder e não do povo?

Quando a gente se questiona e tenta responder às perguntas, a gente vai aquecendo o coração, vai criando sentimentos de empatia, que evitam viver como se nada estivesse acontecendo em volta da gente, ou como se nada do que acontece nos atingisse. Não podemos nos somar a discursos dominantes que justificam mortes cruéis, seja quem for o ajustiçado.

Quando a gente não conhece a realidade na sua totalidade, quando os verdadeiros culpados ficam protegidos por um sistema que tem lado, nos tornamos aliados daqueles que se colocam como donos da lei, inclusive da lei suprema que é a vida, da qual ninguém pode dispor. Um dos grandes desafios é defender a vida, e isso a gente o consegue quando a gente tem sentimentos, quando o coração está aquecido. A friagem sempre tem que ser passageira, sobretudo aquela que pode nos esfriar o coração para sempre.

Ouça:

*Missionário espanhol e Assessor de Comunicação do Regional Norte 1 da CNBB