‘Máquina de moer história’. Assim o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) classifica o Projeto de Lei 490/07, conhecido como ‘Marco Temporal’, o qual a Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (30), para criar uma lei antes de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o mesmo assunto.
Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. Essa terá o julgamento retomado pelo STF no próximo dia 06 de junho. A matéria tem voto contrário do ministro relator Edson Fachin e voto favorável do ministro Nunes Marques.
Com a proximidade de uma decisão do STF que firmará repercussão geral, a Câmara dos Deputados tentará fazer manobra para atender interesses de ruralistas e latifundiários. O missionário Guenter Francisco Loebens, o Chico do Cimi, explica essa relação.
“O Marco Temporal previsto no PL 490 é uma verdadeira aberração aos direitos dos povos indígenas, uma afronta a Constituição, na medida em que, através de um Projeto de Lei, pretende alterar o disposto no artigo 231 da Constituição Federal. Quem está interessado são os ruralistas, aqueles que também apoiam desmatamento, a grilagem de terra e toda prática de crimes ambientais. Pretendem transformar a Constituição de 1988, que foi um marco na conquista e na afirmação dos direitos indígenas, num marco de extorsão, de violação desses direitos dos povos indígenas. Esse regime de urgência se dá exatamente por isso. Para pressionar o Supremo. A inconstitucionalidade, evidentemente, é flagrante, mas existe esse setor ruralista que pretende exercer uma pressão sobre o Supremo para que acolha essa aberração jurídica”. Guenter Francisco Loebens, do Cimi.
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O PL 490/07 reconhece apenas áreas ocupadas pelos povos tradicionais até 5 de outubro de 1988. Por esse motivo, o Cimi afirma que a proposta é uma ‘máquina de moer história’, como cita Chico Loebens.
“Através do Marco Temporal, se consuma o esbulho das terras indígenas, na medida em que se passa uma borracha sobre o direito desses povos, que não se encontram exatamente no dia 5/10/88 em suas terras. Não se encontravam lá exatamente por que foram expulsos de suas terras. Então, se pretende apagar, eliminar a possibilidade de os povos indígenas poderem ter garantidos os seus territórios, depois de expulsos de suas terras. Então, nesse sentido, o Marco Temporal de fato tem a reação contrária de todos os povos indígenas, do movimento indígena de forma muito forte porque mexe e coloca em risco o futuro desses povos”. Guenter Francisco Loebens, do Cimi.
Parlamentares do Amazonas
Entre os oito deputados do Amazonas na Câmara Federal, apenas três votaram contra a o Marco Temporal: Sidney Leite (PSD), Átila Lins (PSD) e Amon Mandel (Cidadania). Todos os outros são favoráveis: Saullo Vianna (União), Fausto Júnior (União Brasil), Alberto Neto (PL) e Adail Filho (Republicanos). Silas Câmara (Republicanos) não votou, mas é coautor do requerimento de urgência.
No STF, Nunes Marques entende que a Constituição deu prazo de cinco anos para a demarcação das terras porque demonstra intenção de estabelecer um marco temporal preciso para definir as áreas indígenas.
Já o relator Edson Fachin defende que a Constituição reconhece o direito dos povos indígenas sobre as terras de ocupação tradicional como um direito originário, ou seja, anterior à própria formação do Estado.
🇧🇷 A Constituição Federal garante aos Povos Indígenas o direito às terras que tradicionalmente ocupam. Confira no artigo 231: https://t.co/C3U6huEL9m pic.twitter.com/V22Y23wzvR
— CNJ (@CNJ_oficial) February 7, 2018
Foto: Tiago Miotto/Cimi
Bruno Elander – Rádio Rio Mar