Quatro anos após o conflito que ficou conhecido como ‘Massacre do Rio Abacaxis’, entre os municípios de Nova Olinda do Norte e Borba, no interior do Amazonas, o Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação civil pública contra o governo federal, o governo do Amazonas e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
Conforme a denuncia do MPF que já tramita na Justiça Federal, o massacre teve oito mortos e uma pessoa está desaparecida até hoje. Os assassinados foram os irmãos Josimar Moraes Lopes e Josivan Moraes Lopes (indígenas do Povo Munduruku); os ribeirinhos Vandrelânia de Souza Araújo, Matheus Cristiano de Souza Araújo, Anderson Barbosa Monteiro e Eligelson de Souza da Silva; e os policiais militares Márcio Carlos de Souza e Manoel Wagner Silva Souza. Além deles, Admilson Silva dos Santos desapareceu.
No caso de Admilson, de acordo com o MPF, ele foi levado pela Polícia Militar (PM) junto da família, que foi encontrada morta. O desaparecimento de Admilson é reconhecido pelo próprio governo do Amazonas, que publicou um memorando com a confirmação do desaparecimento.
Além dos assassinatos, o MPF aponta que houve violação de direitos humanos a partir da violação de domicílio, ameaças, violação ao direito ao devido processo legal e liberdade de ir e vir dos moradores da Comunidade Camarão.
Também houve todas essas violações contra o Povo Maraguá, moradores das Aldeias Mereré, Terra Preta e São José, além da comunidade Santo Antônio do Lira. Além disso, houve tortura de Ezequias da Silva Guerreiro, Zenilda, Daniel, (comunidade Curva do Vento), Erielsson (comunidade Camarão), Jefferson, Maciel (comunidade Santo Antônio do Lira) e Natanael Campos Silva (comunidade Monte Horebe).
Diante de todas a violações, o MPF pediu que a Justiça condene o Estado do Amazonas, o governo federal e a Funai ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, em decorrência dos danos causados pelas violações, por ação e omissão, dos direitos à vida, à incolumidade física, ao devido processo legal, à segurança, à saúde, ao direito de não ser torturado, ao direito a vedação do desaparecimento forçado, no valor mínimo de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais), devendo obrigatoriamente ser utilizado em ações que beneficiem as comunidades do local atingido pelo massacre.
A ação pede ainda o reconhecimento público da responsabilidade pelo massacre, por parte do governo do Amazonas, do governo federal e da Funai, através de divulgação da sentença em jornal de circulação nacional.
Ex-secretário de segurança do Amazonas mentiu em ofício, conclui MPF
Diante do cruzamento de documentos, fatos e depoimentos, o MPF evidenciou à Justiça que o ex-secretário de segurança do governo do Amazonas mentiu em ofício no qual foi questionado sobre o motivo de uma operação policial repentina no Rio Abacaxis.
Na ação, o MPF diz que, no dia 4 de agosto de 2020, recebeu denúncia de que o presidente da Associação Nova Esperança do Rio Abacaxis (Anera), Natanael Campos da Silva, foi conduzido e interrogado ilegalmente pela Polícia Militar, ocasião na qual foi agredido e torturado pelos agentes.
E, no mesmo dia, encaminhou ofício ao secretário de estado de segurança pública do Amazonas (SSP), Louismar de Matos Bonates, para solicitar informações, relatório da operação, a identificação dos agentes, notificação da Funai e cópia de eventuais mandados de busca e apreensão.
Louismar Bonates respondeu com afirmação de que se tratava de operação em curso de combate ao tráfico de drogas, contudo, não prestou nenhuma das informações solicitadas pelo MPF.
De acordo com o MPF, embora o Estado aponte que a presença da Polícia Militar na região era decorrente de idônea operação policial contra o tráfico de drogas, as vítimas do massacre são convergentes em apontar que os policiais atuaram de modo truculento, sem pedir permissão para entrada em suas casas, quebrando objetos e com constantes ameaças e incriminações infundadas.
E no dia 03/08/2020, com uso da embarcação privada Arafat, equipe da (PM), sem identificação oficial, foi até a região do Rio Abacaxis a procura de Bacurau, suspeito de atirar contra o ex-secretário-executivo do Fundo de Promoção Social (FPS) do governo do Amazonas, Saulo Moysés Rezende da Costa, que tentou pescar, sem autorização, na região do Rio Abacaxis.
Em resumo, o MPF evidenciou à Justiça Federal, que a referida operação policial não tinha objetivo de combater o tráfico de drogas, mas sim retaliar os moradores da região por causa do atentado contra Saulo Moysés Rezende da Costa e, posteriormente, pela morte dos dois policiais militares.
Bruno Elander – Rádio Rio Mar
Foto: Divulgação/Anera